terça-feira, 26 de julho de 2011

Parapsicologia e Ciência

       O homem desde seus primórdios, trata de dar respostas satisfatórias aos inúmeros "por que ?", "o que é ? ", "a que se deve ?", que assaltam a sua irriquieta mente. Também desde os primórdios, o homem sempre tentou dominar e transformar a natureza. Dominar a natureza implica no conhecimento das leis que a regem.

     Dominar e saber são fins correlatos. O conhecimento e análise das leis da natureza, as deduções lógicas inferidas a partir delas, o domínio das leis, é o caminho trilhado durante séculos pela ciência. 

     Ciência vem de "scire"; saber, conhecer a realidade. Saber, não opinar; saber a realidade, não o mito. 

     O medo e a insegurança perante fenômenos aparentemente inexplicáveis provocou durante milênios respostas míticas. Terremotos, eclipses, cataclismos, epidemias, loucuras foram interpretados das maneiras mais diversas e desconcertantes para o homem culto de hoje. Cada cultura, cada civilização revestiu de colorido peculiar as explicações dadas a tantos fenômenos que pareciam superar a capacidade de compreensão humana: deuses, demônios, espíritos, fadas, larvas astrais, bruxos, feiticeiros, etc foram durante muitos anos responsabilizados por boa parte dos enigmas que a natureza apresenta. 

   O homem precisava de uma resposta para sentir-se seguro; o nível de conhecimentos científicos ainda não permitia descobrir os verdadeiros "porquês", consequentemente a falsidade das explicações dadas provocou um delírio de superstições das quais, até nossos dias perduram os efeitos.
   
   Frente às interpretações míticas do universo, da natureza e do homem, alguns povos da antiguidade conseguiram avanços consideráveis em ciência: saber com argumentos, conhecimento da realidade. Perto de vinte séculos antes da era Cristã, os Caldeus haviam fixado a duração do ano em 365 dias e um quarto, e sabiam predizer os eclipses solares. As primeiras civilizações do Egito e Babilônia tinham umas unidades fixas para medições de peso, comprimento e volume; e aplicavam princípios da aritmética e geometria nas medições da terra e engenharia.

   Isso nos faz remontar a um período da história do mundo anterior ao ano dois mil e quinhentos A.C. Três séculos antes de Cristo floresceu na Grécia uma escola filosófica (no sentido etimológico: amigos do saber) que deu um impulso extraordinário à matemática, física e biologia. Euclides, Arquimedes, Héron e Pitágoras.

   A filosofia escolástica medieval deu um grande impulso à razão, mas também nela se misturam demasiadamente "argumentos" meramente da autoridade dos grandes mestres. A frase "Magistar Dixit'(o mestre falou) era invocada com muita frequência pela escolástica; quando alguma pergunta comprometedora ameaçava a rígida estrutura do sistema.

   Platão, Aristóteles e a Bíblia foram a fonte sagrada e inabalável para explicar qualquer fato que provocasse uma reflexão profunda. O método experimental nem sempre era levado a sério a as vezes era considerado tabú. A partir de Copérnico (1473-1543), para citarmos um nome significativo, o estudo e análise dos fatos foi substituindo cada vez mais a tendência medieval de racionar preferentemente em torno de questões que estivessem dentro dos limites da autoridade dos grandes mestres e da Igreja. Depois dele, Galileu aplicou o telescópio à observação do firmamento e fez descobertas escandalosas para a época, a tal ponto que as "autoridades" estavam convencidas de que ele deturpava os fatos.

    Com homens como Copérnico, Kepler, Galileu, Descartes, Newton e outros contemporâneos, foi se firmando o espirito cientifico. Eles sustentavam que se investigava menos e se acreditava demais, e que os fatos eram tão importantes quanto a razão. Muitas das crenças e interpretações existentes podiam ser verdadeiras, mas os cientistas precisavam confrontá-las, na peneira dos fatos, quando o tema não fosse exclusivamente transcendente. Esse espírito de observação e análise do fato em si, permitiu a acumulação gradativa de dados, da qual resulta, em grande parte, a ciência de nossos dias. As explicações míticas e supersticiosas dos fenômenos observáveis, sem base no que é constátavel, foram sendo revisadas com espírito de investigação, interessado em observar, medir, pesar e empregar instrumentos de precisão para ajudá-lo a fazer observações exatas. 

      Este modo de estudar o fato veio a se consolidar definitivamente no século XIX, quando teve início, o que comumente é chamada de "era cientifica". A partir deste momento origina-se o imenso esforço de organização e análise dos fatos, de medição exata dos fenômenos. Sistematizam-se os resultados; estabelecem-se leis. As teorias são confrontadas com a realidade. Fixam-se princípios; criam-se regras e os métodos de investigação são criticados e depurados. O mundo envereda definitivamente pelo caminho da ciência. E acredita-se que a descoberta da realidade depende de um método rigoroso que incluiria, como geralmente se admite, os seguintes elementos:

1 - Coletas de fatos. Observação e medição, se forem mensuráveis. 

2 - Elaboraçao de uma hipótese ou teoria visando o agrupamento e melhor compreensão dos fatos e suas causas. lndução e invenção. 

3 - Exame crítico da hipótese, no esforço de torná-la razoável. Qual o significado da hipótese? Simplificação e dedução. 

4 - Comparação das deduções com os fatos observados. Verificação. Mas infelizmente, chega-se também ao exagero, a ponto de a palavra ciência se transformar numa caricatura da ciência, confundindo verdade ou realidade com aquilo que pode ser mensurável direta e materialmente. Imbuídos com este espírito de se aceitar como verdadeiro aquilo que possa ser experimentado pelos instrumentos quantas vezes se quiser, muitos cientistas concentraram seus esforços na análise daquilo, e só daquilo, que podia ser medido mais ou menos facilmente, pesado, tocado, etc. Concentravam-se esforços para estudar a natureza e os fenômenos que a matéria apresentava. Daí o grande passo dado pela física, química e biologia.

     Mas as ciências que estudavam o homem, não progrediram ao mesmo rítmo que as ciências da natureza, porque o fenômeno humano é em muitos aspectos, bem mais difícil de ser "medido" ou é mesmo imensurável, intangivel; etc. A realidade, por ser espontânea, invisível, imponderável, deverá ser excluída da pesquisa cientifica? Medir materialmente é o único método da ciência? Paradoxalmente, mesquinho conceito de ciência tem muitos entusiastas da ciência. 
  
      Em meados do século XIX, estes mesmos cientistas que se esforçam por desentranhar os mistérios da natureza defrontam-se também com uma série de acontecimentos, não menos misteriosos, que aparentemente se dão com o homem: conhecimento do futuro, clarividência, comunicação à distância, entre duas ou mais pessoas, de sentimentos, emoções, imagens, pensamentos, etc, sem intervenção dos sentidos, movimento de objetos à distância sem causa aparente, etc. Homens de espirito inquieto, verdadeiros cientistas, dedicam-se ao estudo desta fenomenologia. 0 objetivo deles é incorporá-la ao campo da ciência, isto é, estudá-la sistematicamente para demonstrar se é real, se de fato estas coisas aconteceram e acontecem ou se são produtos da imaginação de mentes doentias; e em caso positivo, a que se devem, quais as suas consequências. . .  

      Surge assim, a investigação psíquica. Em 1882 funda-se em Londres a S.P.R.("Society for Psychical Research"). Eminentes personalidades no mundo da ciência formam parte desta sociedade de pesquisas. cujo objetivo é o estudo sistemático dos fenômenos "misteriosos" relacionados com o homem. A S.P.R. dá os primeiros passos em busca de um método adequado ao objeto do estudo. Recolhe milhares de casos espontâneos entre a população inglesa; seleciona os mais significativos, após minuciosa triagem e inicia a difícil tarefa de propagar a urgência e necessidade do estudo desta fenomenologia excitante, misteriosa e muitas vezes, aparentemente, em choque com a bem comportada e auto-suficiente "ciência oficial". A exemplo da S.P.R. de Londres, outras sociedades de pesquisas psíquicas surgiram em diversos países, como a "American Society for Psychical Research", publicando revistas e periódicos cujo objetivo sempre foi interessar cada vez mais a opinião científica para empreender o urgente trabalho de investigação séria e sistemática. Em 1934 Joseph Banks Rhine publica uma obra "Extra Sensory Perception". A partir deste livro e devido ao uso da estatística matemática na avaliação das pesquisas, a Parapsicologia começa a ser considerada pelos "deslumbrados" pela ciência. Como se a estatística matemática tivesse que ser o único meio de verificação científica.. .! 

    Por que a Parapsicologia enfrentou, e em muitos países ainda hoje enfrenta, tantas dificuldades e ataques para ganhar um lugar ao sol no mundo cientifico? As causas são várias e complexas. Tentemos sistematizar as principais: 

1 - A confusão gerada pelos pseudo-parapsicólogos. Todas as ciências tiveram seus antepassados "plebeus". A química é filha da alquimia; a medicina, do curandeirismo; a astronomia, da astrologia. . . A Parapsicologia também tem seus antepassados no ocultismo, esoterismo, magia, feitiçaria, espiritismo, etc. Sendo a Parapsicologia uma ciência recente, suas fileiras ainda estão poluídas por grande número de pseudo-parapsicólogos, que semeiam a confusão e enganam a opinião pública, dando vazão às suas superstições e chantagens "científicas", encobertos sob o manto novo e atraente do titulo "parapsicólogo". No Brasil é grande o número de "parapsicólogos por geração espontânea". Se fizermos um levantamento para saber onde se formaram, descobriremos que a maioria adquiriu a Parapsicologia por "graça especial do além". Qualquer astrólogo, curandeiro, ocultista ou espírita se auto-intitula "parapsicólogo". O resultado só pode ser o desprestígio da ciência e a falta de fé das pessoas esclarecidas que confundem a Parapsicologia cientifica e universitária com a ´"parapsicologia esotérica" onde vale tudo. 

2 - Os fracassos das experiências sistemáticas com médiuns: Os primeiros pesquisadores psíquicos com o anseio de chegar rapidamente a resultados positivos, usavam frequentemente dos médiuns profissionais como sujeitos de experimentação. Cedo perceberam que empregavam muito mais tempo e energias em descobrir os truques usados pelos "profissionais do além", do que no trabalho de pesquisa dos fenômenos em si. 0 médium, geralmente um megalomaníaco, muito mais preocupado em "aparecer", em triunfar do que no interesse honesto de servir à ciência. Para obter sucesso sempre, usa dos truques mais diversos, dos mais refinados aos mais grosseiros. A mediunidade em goral tornou-se desacreditada pela extrema dificuldade em traçar uma linha nítida entre a realidade parapsicológica e a fraude deliberada, o auto-logro inconsciente, ou as pequenas trapaças das experiências de insucesso. "No entanto, as experiências em laboratório, para controle da pesquisa moderna de percepção extrasensorial, por exemplo, destinam-se a excluir o logro consciente ou inconsciente tanto quanto humanamente possível; e os controles são rigorosos às vezes, até mais do que em qualquer outro campo de pesquisa. Tanto mais que os "sensitivos" são por definição sensíveis, isto é, mais emotivos do que racionais, frequentemente imprevisíveis, algumas vezes histéricos" . Na realidade, a possibilidade do truque dá mérito à pesquisa cientifica. A matéria não faz truques. 0 homem sim. Neste aspecto, e só frisamos este, a física é fácil; a Parapsicologia, difícil. Pouca prova de espirito cientifico dão aqueles cientistas que se afastam do difícil, que por temor de serem enganados , abandonam a busca da realidade. Devido a esta proliferação do truque, tanto os pesquisadores como a aceitação dos fenômenos parapsicológicos caíram no desprestígio do povo e dos cientistas que irrefletidamente não distinguiam o truque da realidade. Foi por isso que os pesquisadores trocaram os pitorescos salões à meia luz, das sessões espíritas, pelas frias salas dos laboratórios de experimentação à prova de fraude, e substituíram a experimentação em sessões espíritas programadas, pela análise dos casos espontâneos. 

3 - O ponto de atrito com a ciência clássica: Os fenômenos parapsicológicos, pela sua relação e vinculação histórica,despertam em muitas mentes, inclusive de pessoas cultas ,um certo temor, chegando a confundir a Parapsicologia com termos tais como mítico, esotérico, ocultista, mágico, ou em outra ordem de coisas, religioso, diabólico, milagroso. . . Esta identificação prejudica o bom entendimento do que seja ou não seja a parapsicologia. Muitos cientistas, ainda hoje, não aceitam o cunho científico da Parapsicologia por considerá-la a prióri, uma versão moderna desse submundo mórbido das chamadas ciências ocultas, ou em outro plano, do mundo transcendente do sobrenatural e fora da verificação cientifica. Na realidade, relacionamento não significa identidade. Análise dos fatos, como fatos, do nosso mundo, não implica numa imersão no religioso, demoníaco, divino, sobrenatural, como tais. Outra causa:(Certos cientistas, diante de relatos aparentemente misteriosos, do tipo parapsicológico, reagem de uma maneira pouco prudente: "isto não pode ser verdade porque contraria as leis estabelecidas pela ciência a respeito da natureza. . ." A telepatia e a precognição, por exemplo, como "fatos brutos" e isolados, parecem inadmissíveis. 0 cientista é colocado perante um dilema. Em primeiro lugar é obrigado a confiar na observação empírica. Em segundo lugar pensa que todos os fatos observados devem se ajustar a um esquema único e ordenado, até hoje perfeitamente admitido pela ciência. Que fazer quando depara que um fato observado, não se encaixa em nenhuma parte do esquema já ordenado e estabelecido? A reação de muitos cientistas foi negar o fato e dizer: "É impossivel". Mas não se deveria considerar impossível um fato tão somente por ser estranho. A ciência opõe "é" a "deve ser". Um presunçoso ceticismo que rejeita fatos, sem os examinar para ver se são reais é mais condenável, sob certos aspectos, que uma credulidade irracional. 0 físico Lord Kelvin afirmou corretamente que a ciência é obrigada, pela lei eterna da honra a enfrentar, sem temor, todos os problemas que lhe possam ser regularmente apresentados". Séculos atrás, em nome da Biblia, erroneamente interpretada, negava-se a Galileu o direito do publicar a constatação dos fatos. Hoje em dia, em nome da ciência clássica, nega-se o direito de existência a certos fenômenos constatados através de milhares do experiências. Trata-se do mesmo tipo de dogmatismo: um causado pelo fanatismo religioso, outro pelo fanatismo científico. 

4 - As dificuldades metodológicas: Aludimos anteriormente que muitos homens de ciência possuem a tendência de afirmar que, para se esperar deles uma consideração séria dos fenômenos parapsicológicos, deve-se provê-los de uma técnica experimental mediante a qual possam observá-los e repetí-los à vontade. Exigem que estes tipos de fenômenos sejam equiparados com os fenômenos ordinários dos laboratórios físicos ou químicos. Ora, a experimentação parapsicológica demonstra que os fenômenos parapsicológicos são espontâneos e diretamente improvocáveis. Mas será que esta dificuldade implica em que estes fenômenos sejam realmente ilusórios?

       Nas ciências físicas lidamos com fatos abertos diretamente à inspeção dos sentidos. E tais fatos podem ser continuamente observados. Além do mais, mediante a intervenção direta dos nossos corpos podemos controlá-los e variar suas condições. É fácil a experimentação e a observação. 

     Mas a situação muda quando nos encontramos com acontecimentos que não ocorrem nem no mundo físico, nem na mente consciente. Os únicos meios que conhecemos para chegar a descobrir os fatos que acontecem no inconsciente é esperar que estes se manifestem em nível de observação consciente. Tudo quanto podemos fazer é colocar a pessoa nas condições em que a experiência demonstrou que costumam acontecer tais fenômenos. Isto, às vezes, se consegue através de transe hipnótico provocado das maneiras mais diversas.

     Mas não parece razoável, para que a observação possa ser válida cientificamente, exigir um controle repetível à vontade, comparável aos obtidos nos laboratórios físicos. Em Parapsicologia, caminhamos como se fossemos avançando em terras de um continente desconhecido, mas já se tem chegado a um grau de observação de importância considerável. 

   A repetibilidade, à vontade, faz referência à facilidade da observação, não ao valor científico. É fácil estudar um fenômeno físico. É infinitamente mais difícil analisar um fenômeno parapsicológico.
  
   "Quanto mais difícil seja aceitar a existência dos fenômenos - disse Laplace, tanto maior é o dever de investigá-lo minuciosamente". Não é de teor científico negar a existência real de um fenômeno porque este foge às leis e parâmetros usados na penetração do mundo físico.

     Portanto, a objeção de que a Parapsicologia não é ciência porque os fenômenos que estuda não podem ser repetidos à vontade, é inaceitável. Este mesmo "argumento" levaria a rejeitar o cunho do científico a toda uma ordem de fatos que não apresentam o estrito determinismo da física - química. Existem, porém, fatos naturais que fogem à reprodução experimental (a meteorologia, a astronomia, a história, por exemplo). Embora a Parapsicologia estude os fenômenos à margem do comum, estas "anormalidades" podem ser observadas e além do mais, classificadas e ordenadas em grupos naturais, fazendo analogia real e prestando-se a uma classificação científica. 

    Apesar das dificuldades metodológicas, o rigor científico da moderna Parapsicologia é tão assombroso que Arthur Koestler escreveu: "Tais acusações (contra a Parapsicologia) baseiam-se, em parte numa legítima repulsa à superstição e às tranças com o Ocultismo". Mas procedem sobretudo, da falta de informação sobre a evolução recente das ciências exatas e da Parapsicologia. A pesquisa parapsicológica tornou-se mais rigorosa, levantou estatísticas, entrou nos computadores. 

     A Parapsicologia é uma disciplina tão científica como qualquer outra das consideradas ciências clássicas. Sua metodologia, tão rigorosa que poucas ciências têm suas "verdades" tão provadas quanto as da Parapsicologia. E sua importância para descobrirmos quem é o homem, é tão urgente que é de se desejar vivamente sua inclusão nos currículos universitários com a máxima rapidez possível. 



Pablo Garulo
 Revista de Parapsicologia nº 23


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